sábado, 26 de janeiro de 2013

Sem pendurar as Sapatilhas

Com 90 e 84 anos, respectivamente, as bailarinas Tatiana Leskova e Angel Vianna seguem ativas no palco e nas coxias
por Lúcia Monteiro

As bailarinas Tatiana Leskova (à esq.) e Angel Vianna. Angel ainda dança; Tatiana dirige espetáculos


Dance, dance. Senão estamos perdidos.” Estampada nos cartazes do filme que o cineasta Wim Wenders dedicou a Pina Bausch em 2011, a frase da coreógrafa alemã serve de mote para duas bailarinas veteranas: Tatiana Leskova e Angel Vianna. Num fim de tarde de dezembro, as duas se encontraram no Green Room do Paissandu Athletico Clube, no Rio de Janeiro, onde se deu a festa de aniversário da primeira. Filha de russos nascida em Paris, Tatiana celebrava seu 90º ano de vida.
Ela, que dois meses antes dirigira uma remontagem do grand pas-de-deux do Quebra Nozes para a São Paulo Companhia de Dança, comemorava também a publicação, no Brasil e em Londres, de um livro sobre sua trajetória. Organizado por Joel Gehlen, Ballet Fotográfico Tatiana Leskova exibe fotos de quando a artista encenava as coreografias do russo Léonid Massine.
Aos 84, a mineira Angel não podia faltar à ocasião. “Tatiana foi minha patroa por nove anos. Uma ótima patroa, aliás.” À frente da Angel Vianna Escola e Faculdade de Dança, no bairro carioca de Botafogo, onde ensina sobretudo técnicas contemporâneas, ela se preparava para a aula-espetáculo que daria por ocasião do lançamento de seu site. O endereço (angelvianna.art.br) reúne 400 fotografias da dançarina em cena, além de cartas, documentos, registros coreográficos e 619 textos publicados na imprensa a seu respeito. Estão ali, por exemplo, uma foto de 1960 que mostra Angel no espetáculo Caso do Vestido, inspirado em um poema de Carlos Drummond de Andrade, assim como uma carta do poeta autorizando a adaptação. O caminhar esguio das duas bailarinas indica que, para elas, a aposentadoria realmente não faz parte do repertório.
*Angel Vianna em 1961. Ela abandonou o balé clássico para se dedicarà dança contemporânea

Antes de abrir sua própria escola – onde deu emprego à colega de Minas e lecionou para debutantes que se tornariam grandes coreógrafas, como Deborah Colker e Márcia Haydée –, Tatiana integrou corpos de baile dirigidos por russos exilados, sucessores do coreógrafo Serguei Diaghilev. Passou pelo Ballet Russe de Monte Carlo, com sede em Mônaco, e pelo Original Ballet Russe, que realizou longas turnês ao redor do mundo. Para não perder a forma durante as viagens, seus bailarinos faziam aulas em barras instaladas dentro dos navios, como os que levaram Tatiana à Austrália e a Cuba.
Quando aportou no Brasil, em 1944, conheceu a paixão de sua vida – um homem casado – e decidiu ficar. Continuou dançando e, de 1950 a 1957, chegou a dirigir o Corpo de Baile do Theatro Municipal do Rio de Janeiro.
A história de Angel é igualmente regida pelo amor. Ao lado do marido coreógrafo, ela fundou o Balé Klauss Vianna em 1962. O casal também construiu um método próprio de ensino, que permite a atores e bailarinos desenvolver a consciência do corpo e de seus movimentos. Angel e Klauss criaram, ainda, o departamento de dança da Universidade Federal da Bahia.
Nuvem
Quando a mineira chegou ao Rio, Tatiana a convidou para dar aulas de balé clássico. A bailarina de Belo Horizonte havia estudado a dança com Carlos Leite, ex-aluno da russa Maria Olenewa. Na escola de Tatiana, Angel também trabalhava na preparação de atores. Com o tempo, abandonou as pontas, os tutus e o clássico. Se hoje segue nos palcos, é porque elegeu a dança moderna e, depois, a contemporânea. Ela imaginava que continuaria na ativa depois dos 80? De jeito nenhum. “Tudo é surpresa, não? Neste momento, estou pensando que a vida é uma ficção. Gente é como nuvem, sempre se transforma. O que quero dizer é que ninguém precisa parar. Basta se modificar. Há tantas maneiras de fazer as coisas... Posso dançar até sentada! Movimento não é só a busca de uma forma. Tem sentimento, envolve toda a memória do corpo.”
*Tatiana Leskovaem 1956. A bailarina nasceu em Parise, antes de se fixarno Rio, fez longas turnês pelo mundo
Na década de 1960, depois de uma cirurgia e de oito meses de recuperação, Tatiana voltou aos palcos, mas não por muito tempo. Encerrou sua carreira de bailarina aos 43 anos, em Montevidéu, no Uruguai, dançando pela última vez Giselle ao lado de Aldo Lotufo, primeiro bailarino do Municipal do Rio. Na opinião dela, é mais honesto parar do que simplificar balés de repertório para conseguir executá-los – reduzindo, por exemplo, a quantidade de giros ou a complexidade dos passos. “Comecei a me dedicar mais a meus alunos e aprofundei meus conhecimentos com a ajuda deles”, explica Tatiana, que hoje mantém a forma impecável graças a sessões diárias de Pilates e Gyrotonic. “Parece ridículo, mas continuo dançando mentalmente sempre que ouço as músicas dos grandes balés.”
Fonte: REVISTA BRAVO

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